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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Mosaico de sorrisos

Se me perguntarem se sou itapecericana ou paulistana, não sei o que respondo. Moro em Itapecerica da Serra, e gosto muito de viver aqui. Mas a paixão por São Paulo é amor antigo, nasceu comigo, cresceu e tomou conta. São Paulo é a cidade do meu coração, dos meus sonhos, da minha vida; por isso não posso deixar de, assim como tantos, célebres ou não, homenagear minha cidade.
Andar por São Paulo pode ser desgastante, concordo. Indo de carro, a pé, ônibus ou metrô, a certeza é de passar sufoco. Mas saiba olhar os pequenos detalhes. O azul do céu, que mesmo em risco de extinção tem uma tonalidade única. Os antigos comércios, que concorrem com grandes cooperativas. O charme dos cafés, que enfeitam a cidade de esquina em esquina, assim como suas meninas.
Da Liberdade ao Paraíso, o mundo em poucas ruas. As vilas, Mariana e Madalena, que transbordam seu charme e seu acolhimento. A Paulista, o grande coração executivo; e o Parque do Ibirapuera, o coração verde. São Paulo, berço de arte, de literatura, de música, de correria, de amor. Pare um momento e preste atenção, a cidade canta, a cidade dança, a cidade pulsa num ritmo envolvente, num jazz ou num samba, a cidade não para, respira e transpira por si e por todos, alucinante, vertiginosa. E acolhedora. E elegante. E cheia de contrastes. O executivo e o homem de rua, o Copan e o Hotel Hilton, o novo e o antigo, o bom e o ruim, a pobreza e a riqueza. Num balé triste, mas real. Num balé que pede mais, mas pede ajuda, e pede um novo escritor.
Então pegue qualquer trem, das novas ou antigas linhas, e desça na estação da Luz. Saia do labirinto de metrô e veja o antigo se revelar diante de seus olhos, e o novo pintar uma paisagem de contrastes que enche os olhos de luz. Visite os museus, visite o centro histórico e deixe que a cidade conte sua história.
E do alto da Torre do Banespa, onde céu e terra não parecem tão distantes, imagine "num só minuto, o Brás, Tietê, viaduto; barracas de flores, e a multidão". Contemple São Paulo, "São Paulo da garoa, São Paulo que terra boa". 
E olhe bem, preste atenção. Ali, na Praça da Sé, diante de testemunhos de um tempo remoto, em que não havia 'Shopping Center' nem multinacional. Tempo em que era Luz, Anhangabaú e Viaduto do Chá. Ali, no marco Zero. Marco da cidade que nasceu, cresceu, se espalhou e hoje não vive, mas é vívida e vivida. Cidade de mil cores, mil paixões, mil cheiros, mil sabores. Cidade que é mosaico do que foi e do que é e do que será. E de sorrisos.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Um dó, um sol

Incessantes gotas de chuva batem na janela, renovando uma música tão antiga quanto o próprio tempo, cantando para corações e ouvidos atentos.
Uma melodia familiar, de inúmeros ritmos, que faz com que o coração dance no mesmo compasso, acompanhando o blues que a noite chora.
Os ouvidos talvez fiquem ainda acordados para ouvir os acordes finais da balada melancólica da noite, vestindo-se de compaixão.
E depois de um dó, vem um sol.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Magos e feitiços

Eu começo a escrever e depois de uma linha apago tudo. Não que eu tenha uma ideia clara na cabeça, a minha vontade é de apenas escrever. Faria mais sentido desistir e voltar quando eu soubesse sobre o que escreverei, mas tenho a impressão de estar cheia, transbordando, de ideias e sensações, e preciso colocar isso para fora, nem que seja de modo irregular e confuso.
A verdade é que eu ando entre outros mundos, onde a carne é de papel e o sangue é de tinta, onde posso conversar com fadas e elfos e viver aventuras medievais. Onde posso derrotar príncipes cruéis e dançar com saltimbancos; e isso me desvia da realidade de carne e osso, que eu sei que no fundo, pode ser tão emocionante como a dos livros.
Mesmo que os ame de todo o coração, sei bem o mal que eles podem fazer, como um remédio mal manipulado. Por um lado, pode te trazer conforto, mas em excesso tem um efeito contrário.
Eles têm o poder de intoxicar a mente, nos manipular de uma tal forma que às vezes nos pegamos vivendo como aquele personagem que tanto gostamos. E talvez seja por isso, por essa mágica envolvente absorvida por cada palavra é que eles sejam tão atraentes, envolventes, acolhedores. E mesmo que me causem danos, mesmo que depois de ler um ou outro me perca na realidade por alguns dias, me arrisco e me jogo de cabeça, pois sei que nada me distrai e me completa e me acolhe mais do que um bom livro. 

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Diversidade

Passando a tarde na casa da minha avó, sempre corremos o risco de receber a visita de parentes distantes. Dessa vez, durante o almoço, ela comunicou que um sobrinho, um tal de Pedrinho, passaria ali para o café da tarde. Até aí, normal.
Chega então um dos "tios", acompanhado com um homem de seus quarenta e tantos anos. Seria aquele o Pedrinho? E não é que era?! Ele vinha com a nova mulher, de mesma idade, com aquele sotaque de interior de Minas que é inconfundível.
E então começou: "Essa aí é sua menina mais velha? Mais como tá grande, sá."; e em meio a esses comentários, a conversa foi vingando. "Era um sinhô barbudo que só, começô a tê dô na barriga, procurô o seu dotô lá de pertin de casa. Tava é com o bixo no figu". Minha avó então traduziu, "Câncer no fígado?! Ô dó, era tão novin".
O tal de Pedrinho que não era tão 'inho' então disse que precisava contar um causo. E é por causa do causo que eu escrevo.
"Nóis tinha ido passeá lá em Poços de Caldas" ele disse "E eu sentei do lado de um professô. Homem sabido, já véio aposentado, mais muito sabido ainda. E ele me preguntou: 'Ô Pedro, cê sabe qual é a coisa mais bunita dessa vida?', eu disse que não sabia, e ele arrepondeu: 'A diversidade. Imagina se tudo fosse inguar assim?'.
Então eu desliguei. Sei que ouvi à meios ouvidos o final da "prosa". Sei até que quase tive um acesso de risos quando ouvi que quando a gente quisesse visitar ele lá em Minas Gerais, era só chegar na igrejinha, que seu vizinho era o "véio Barnabé". Mas eu só pensava no tal causo que o sobrinho da minha avó tinha contado.
E não é que fazia sentido? O português podia estar todo errado, e estava mesmo. Mas a ideia era tão certa. Lembrei daquele velho ditado: "o que seria do vermelho, se todos gostassem do amarelo?". O mais bonito da vida é mesmo a diversidade. De cores, de sabores, de sons, de sentimentos, de toques, de cheiros. A diversidade e a escolha. Com essa visita, que não durou mais de uma hora, bem ao estilo caipira, aprendi tanto. Aprendi a não me deixar julgar pelo jeito que a pessoa fala. Aprendi a respeitar o simples. E aprendi a enxergar e dar valor a toda essa diversidade.
E como dizem os meus tios, ao se despedirem, "Até segunda, sá!".